portugues do brasil por favor!
O país mais fechado (e estranho) do mundo
A reportagem de VEJA entrou na Coreia do Norte, onde não há celular nem internet, crianças de 5 anos recitam juras de vingança contra os Estados Unidos e é proibido dobrar jornais que trazem a foto do líder Kim Jong-Il
O presidente da Coreia do Norte não aparece em público há mais de quinze anos. Mesmo assim, os 23 milhões de habitantes do país enxergam seu rosto da hora em que acordam até a hora em que vão dormir. A imagem de Kim Il-sung, o "eterno presidente", pai do atual ditador Kim Jong-Il, está nos prédios, nos vagões de trem, nas estações de metrô e no broche que 100% da população de Pyongyang, a capital da Coreia do Norte, carrega "voluntariamente" no peito. "Embora tenha falecido em 1994, o nosso presidente continua vivo em nosso coração", diz a guia que recebe a reportagem de VEJA no aeroporto de Pyongyang. Ter um presidente morto é só uma das extravagâncias que fazem da Coreia do Norte uma aberração planetária. O regime mais isolado do mundo sobreviveu à morte de seu fundador, à derrocada do comunismo e a uma gestão catastrófica que matou de fome quase 3 milhões de pessoas no fim dos anos 90. Hoje, seria apenas um fóssil grotesco não fosse o fato de seu líder estar sentado sobre a bomba atômica. Esta repórter visitou o país de Kim Jong-Il na condição de turista (a entrada de jornalistas só é permitida mediante autorização do governo, que nunca a concede), levada por uma agência de viagens chinesa juntamente com um grupo de dezenove estrangeiros. Os seis dias passados lá mostraram que, mais do que um picadeiro para as bizarrices de Kim Jong-Il, a Coreia do Norte é uma sociedade oprimida pela fome e controlada pelo medo – e isso nem mesmo a onipresente propaganda do regime consegue esconder.
A viagem aérea de Pequim a Pyong-yang leva uma hora e meia e é feita num Tupolev russo. A parte mais desconfortável é ter de equilibrar sobre as pernas uma edição do Pyongyang Times, distribuída aos passageiros, sem amassá-la nem deixá-la cair no chão. Não se trata de mania. Ainda na China e, novamente, antes do embarque, os organizadores da excursão alertaram os turistas para que não dobrassem jornais que estampassem a foto de Kim Jong-Il (caso da edição lida no avião e, pelo que se viu mais tarde, de todas as outras já rodadas no país), sob pena de "ofender gravemente" os norte-coreanos. A lista de atitudes proibidas incluía ainda falar com a população nas ruas, tirar fotografias sem permissão e perguntar aos guias nativos sobre questões como a saúde de Kim Jong-Il ou a existência de campos de concentração no país. Na chegada ao aeroporto de Pyongyang, o grupo foi obrigado a entregar os celulares e a submeter toda a bagagem a uma revista cuidadosa, destinada a evitar o ingresso de material ideologicamente suspeito. O que seria ideologicamente suspeito? Basicamente tudo. Os norte-coreanos não podem ler livros, jornais e revistas estrangeiros e, à exceção de uma reduzidíssima elite, não têm acesso à internet, celular nem a rádio ou canais de TV que não sejam os oficiais.
Da janela do ônibus que leva o grupo ao hotel, a paisagem que se avista é de romance do inglês George Orwell, autor da distopia 1984: imensos pôsteres de propaganda comunista decoram as avenidas, hordas de soldados marcham nas ruas – parte das tropas entoa uma música que será ouvida à exaustão nos próximos dias, a Canção do General Kim Il-sung – e carros equipados com alto-falantes conclamam a população para o trabalho. A guia explica que o país está no penúltimo mês da "Campanha dos 150 Dias": a primeira etapa do esforço nacional destinado a fazer a Coreia do Norte crescer 20% até 2012, data em que o país celebrará os 100 anos do nascimento de Kim Il-sung. As outras atrações do percurso são a Universidade Kim Il-sung, o Estádio Kim Il-sung e a Praça Kim Il-sung, de onde é possível avistar, ao longe, a próxima parada: uma imensa estátua de bronze de Kim Il-sung, em cujos pés os recém-chegados são convidados a depositar flores. Onde quer que se olhe, lá está a imagem do presidente eterno em várias versões: sentado, com o olhar voltado para o futuro; caminhando, de mãos dadas com criancinhas; de peito empinado, entre um soldado, um camponês e alguém que carrega um livro (bingo, é o intelectual).
"O PRESIDENTE ETERNO"
Em Pyongyang, norte-coreanos reverenciam a estátua de Kim Il-sung, pai do ditador Kim Jong-Il e o único morto a presidir um país
O QUE SE MOSTRA E O QUE SE ESCONDE
No espetáculo exibido aos turistas, meninos e meninas de menos de 6 anos de idade cantam músicas de louvor ao regime e juram vingança contra o "imperialismo americano". À direita, criança pede esmola em parque de diversões: essa a propaganda não mostra